O QUE ELES ESCONDEM

sexta-feira, 4 de julho de 2014


A UNIDADE DA ESQUERDA REVELA QUEM É DE DIREITA E APOIA AS POLÍTICAS CRIMINOSAS DA TROIKA

O Partido Comunista Português e o Bloco de Esquerda integram, no Parlamento Europeu, o Grupo Confederal da Esquerda Unitária Europeia / Esquerda Verde Nórdica (GUE/NGL).
Para o novo ciclo, iniciado com as eleições europeias de 25 de Maio último, este grupo político escolheu Pablo Iglesias, do Podemos espanhol, como candidato à presidência daquela instituição.

Sabia-se que não iria ser eleito, já que PS, PSD e CDS e respectivos grupos europeus, tal como a nível nacional, se uniam numa irmandade de direita.
E assim foi, uma vez mais, com o alemão Schulz, da coligação no governo Merkel, a reunir 64% dos votos.

Se alguém, ingenuamente, ou não, perguntar a razão deste conluio, a resposta não se fará esperar: é que é necessário travar o passo aos partidos populistas e aos de ultradireita, xenófobos, eurófobos.
Significa isto meter no mesmo saco os nacionalistas britânicos de Nigel Farage ou ultras como Marine Le Pen (que, nos respectivos países, são muito bem tratados, com omnipresença nos media) e Pablo Iglesias, Alexis Tsipras, do Syriza grego e, ainda, a Isquierda Unida espanhola ou a CDU portuguesa, de que fazem parte os partidos comunistas destes países.

São, na realidade, estes últimos que metem medo à coligação de direita, visto o aumento de apoio popular que registam e a unidade que mostram a nível europeu.
O discurso de Pablo Iglesias, no Parlamento Europeu, que os meios de comunicação censuraram e que os eurodeputados da coligação de direita nunca gostariam de ter ouvido, é, de facto, importante, pelo conteúdo e, até, pela forma.

As imagens estão na Net (onde se pode, igualmente, apreciar o incómodo de uma tal Rodrigues, grande cabeça pensante do PS), assim como o texto em espanhol. Nós deixamos, aqui, a tradução para português.


DISCURSO DE PABLO IGLESIAS, COMO CANDIDATO À PRESIDÊNCIA DO PARLAMENTO EUROPEU

É uma honra dirigir-me aos senhores para apresentar a minha candidatura à presidência desta câmara. Este parlamento tem por obrigação representar a soberania da Europa e devemos, senhores deputados, estar à altura do que isso, hoje, significa.
O sonho da Europa foi, muitas vezes, sepultado, mas sempre conseguiu despertar de novo. Assim aconteceu há quase 70 anos: a Europa voltou a despertar com a resistência dos seus povos contra o fascismo, os sobreviventes dos campos de extermínio, aqueles que deram a sua vida pela justiça e liberdade. Milhares de compatriotas meus, que haviam lutado em defesa da democracia em Espanha, participaram nessa luta e nesse sonho de justiça. Não imaginam o orgulho que tenho, como espanhol, pelo facto de os primeiros tanques, que entraram a libertar Paris, terem sido guiados por combatentes espanhóis. Hoje, quando a intolerância e a xenofobia voltam a ameaçar-nos, quero reivindicar a memória europeia do antifascismo e a de todos os povos amantes da liberdade e da democracia.

Senhores deputados, o melhor do nosso continente e da nossa história comum forjou-se nas revoluções que fizeram do povo o sujeito de direitos, por cima de reis, de deuses, de nobres e grandes proprietários. O melhor património da Europa é a vontade dos seus cidadãos em ser livres e não escravos de ninguém. Não ser escravo de ninguém, senhores deputados, isso é a democracia.
Daí que deva dizer-lhes, hoje, que os povos a quem devemos as liberdades e os direitos sociais não lutaram por uma Europa em que as suas gentes vivam com medo da pobreza, da exclusão, do desemprego ou desamparo na doença. A expropriação da soberania e a sujeição à governação das elites financeiras ameaçam o presente e o futuro da Europa, ameaçam a nossa dignidade, ameaçam a igualdade, a liberdade e a fraternidade, ameaçam a nossa vida em comum.

A criação de novas instâncias supranacionais não tem que ser paga ao preço de impossibilitar o exercício de cidadania. Os nossos povos não são menores de idade, nem colónias de nenhum fundo de investimento, não conquistaram e defenderam a sua liberdade para entregá-la a uma oligarquia financeira. Não são termos abstractos, senhores deputados, todos os senhores conhecem bem o problema. É escandalosa a facilidade com que se movem, aqui, os lóbis, ao serviço de grandes corporações, assim como as portas giratórias, que convertem os representantes dos cidadãos em milionários a soldo das grandes empresas. Há que dizê-lo alto e bom som: esta maneira de funcionar rouba a soberania dos povos, atenta contra a democracia e converte os representantes políticos numa casta.
Senhores deputados, a democracia, na Europa, foi vítima de uma deriva autoritária. Na periferia europeia, a situação é trágica: os nossos países converteram-se quase em protectorados, em novas colónias, onde poderes que ninguém elegeu estão a destruir os direitos sociais e a ameaçar a coesão social e política das nossas sociedades.

Da América Latina aprendemos que a dívida externa está desenhada para ser impagável e que os países que mais têm crescido fizeram-no com um desagravamento substancial e uma auditoria pública à sua dívida. Todos, nesta câmara, sabem da dívida perdoada, não há muito tempo, à Alemanha. Não é apenas uma questão de justiça. Tem que ver com a integração europeia e com a democracia: a dívida é, hoje, um mecanismo de mando e saque dos povos do sul. É isso que está a suceder nos países que, com marcado racismo, alguns denominam PIGS. Mas, suponho que os senhores são conscientes de que não há Europa sem os seus povos do Sul, como não há sem os seus povos do Leste, submetidos também a duras condições da Troika, cujo rumo ameaça destruir o projecto europeu, deixando um rasto de miséria, pobreza e violência.
Porém, há outro caminho. Há alternativa às políticas de empobrecimento e ao sequestro da soberania. Este Parlamento Europeu, nesta hora crítica para a Europa, deve estar à altura, deve mostrar sensibilidade e converter-se no epicentro de um estremeção democrático na União Europeia, um estremeção que trave a deriva autoritária da Troika. Este Parlamento deve expressar a legitimidade democrática de origem, que a todos nos une – a voz dos cidadãos – e não os conluios entre elites. O Parlamento Europeu não pode ser um prémio de consolação, nem uma reforma doirada.

Senhores deputados, hoje não me dirijo a uma câmara de cinco, seis ou sete grupos parlamentrares. Tão-pouco me dirijo aos aparelhos partidários. Dirijo-me aos senhores, senhoras e senhores deputados, porque os senhores têm um contrato de responsabilidade política, assinado com os vossos povos. Dirijo-me aos democratas e às suas consciências. A nossa primeira fidelidade, a que todas as demais devem subordinar-se, é com os cidadãos que nos elegeram. Eles não estão nos corredores deste edifício, nem nos hotéis que rodeiam esta câmara. Mas, não se esqueçam; eles são os soberanos e, cedo ou tarde, pedirão contas do que foi feito em seu nome.
Dirijo-me, também e muito especialmente, aos meus colegas eurodeputados dos países do Sul da Europa. Os senhores viram as consequências reais que têm as políticas impostas pela Troika. Os senhores sabem que as políiticas de austeridade fracassaram: os nossos países são hoje mais pobres, com economias destruídas, com sociedades feridas de injustiça e instituições despedaçadas pela corrupção e pelo descrédito. Os senhores sabem que está na hora de ajudar os nossos países a porem-se, de novo, em pé. Peço-vos que, pelo menos, votem como gregos, como irlandeses, como portugueses, como italianos, como checos, como polacos, como romenos, como espanhóis. Não só para que possam olhar de frente a vossa gente, quando voltam a casa, mas porque, assim, estarão a defender a Europa. Peço o voto consciente de muitos dos senhores, que não se reconhecem neste sequestro da democracia, sabendo que muitos estão sinceramente comprometidos com o bem-estar dos seus povos. Peço-lhes o voto para travar a grande coligação que impõe austeridade e totalitarismo financeiro.

Quero dirigir as minhas últimas palavras aos cidadãos e povos da Europa, que saíram à rua, estes anos, para defender a justiça social e a democracia. Aos milhões que haveis dito basta, nas praças europeias, quero dizer-vos que sois o orgulho, o coração democrático da Europa. Mantende alta a bandeira da dignidade. Nós, povos da Europa, já passámos por piores situações e livrámo-nos dos déspotas. Não sei se hoje poderemos arrebatar a presidência deste parlamento à grande coligação, mas se nos seguis, empurrando, asseguro-vos que venceremos. O amanhã é nosso.

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