A UNIDADE DA ESQUERDA REVELA QUEM É DE
DIREITA E APOIA AS POLÍTICAS CRIMINOSAS DA TROIKA
O Partido Comunista
Português e o Bloco de Esquerda integram, no Parlamento Europeu, o Grupo
Confederal da Esquerda Unitária Europeia / Esquerda Verde Nórdica (GUE/NGL).
Para o novo ciclo, iniciado
com as eleições europeias de 25 de Maio último, este grupo político escolheu
Pablo Iglesias, do Podemos espanhol,
como candidato à presidência daquela instituição.
Sabia-se que não iria ser
eleito, já que PS, PSD e CDS e respectivos grupos europeus, tal como a
nível nacional, se uniam numa irmandade de direita.
E assim foi, uma vez mais,
com o alemão Schulz, da coligação no governo Merkel, a reunir 64% dos votos.
Se alguém, ingenuamente, ou
não, perguntar a razão deste conluio, a resposta não se fará esperar: é que é
necessário travar o passo aos partidos populistas e aos de ultradireita,
xenófobos, eurófobos.
Significa isto meter no
mesmo saco os nacionalistas britânicos de Nigel Farage ou ultras como Marine Le
Pen (que, nos respectivos países, são muito bem tratados, com omnipresença nos media) e Pablo Iglesias, Alexis Tsipras,
do Syriza grego e, ainda, a Isquierda Unida espanhola ou a CDU portuguesa, de que fazem parte os
partidos comunistas destes países.
São, na realidade, estes
últimos que metem medo à coligação de direita, visto o aumento de apoio popular
que registam e a unidade que mostram a nível europeu.
O discurso de Pablo
Iglesias, no Parlamento Europeu, que os meios de comunicação censuraram e que
os eurodeputados da coligação de direita nunca gostariam de ter ouvido, é, de
facto, importante, pelo conteúdo e, até, pela forma.
As imagens estão na Net
(onde se pode, igualmente, apreciar o incómodo de uma tal Rodrigues, grande
cabeça pensante do PS), assim como o texto em espanhol. Nós deixamos, aqui, a
tradução para português.
DISCURSO DE PABLO IGLESIAS, COMO
CANDIDATO À PRESIDÊNCIA DO PARLAMENTO EUROPEU
É uma honra dirigir-me aos senhores
para apresentar a minha candidatura à presidência desta câmara. Este parlamento
tem por obrigação representar a soberania da Europa e devemos, senhores
deputados, estar à altura do que isso, hoje, significa.
O sonho da Europa foi,
muitas vezes, sepultado, mas sempre conseguiu despertar de novo. Assim
aconteceu há quase 70 anos: a Europa voltou a despertar com a resistência dos
seus povos contra o fascismo, os sobreviventes dos campos de extermínio,
aqueles que deram a sua vida pela justiça e liberdade. Milhares de compatriotas
meus, que haviam lutado em defesa da democracia em Espanha, participaram nessa
luta e nesse sonho de justiça. Não imaginam o orgulho que tenho, como espanhol,
pelo facto de os primeiros tanques, que entraram a libertar Paris, terem sido
guiados por combatentes espanhóis. Hoje, quando a intolerância e a xenofobia
voltam a ameaçar-nos, quero reivindicar a memória europeia do antifascismo e a
de todos os povos amantes da liberdade e da democracia.
Senhores deputados, o melhor
do nosso continente e da nossa história comum forjou-se nas revoluções que
fizeram do povo o sujeito de direitos, por cima de reis, de deuses, de nobres e
grandes proprietários. O melhor património da Europa é a vontade dos seus cidadãos
em ser livres e não escravos de ninguém. Não ser escravo de ninguém, senhores
deputados, isso é a democracia.
Daí que deva dizer-lhes,
hoje, que os povos a quem devemos as liberdades e os direitos sociais não
lutaram por uma Europa em que as suas gentes vivam com medo da pobreza, da
exclusão, do desemprego ou desamparo na doença. A expropriação da soberania e a
sujeição à governação das elites financeiras ameaçam o presente e o futuro da
Europa, ameaçam a nossa dignidade, ameaçam a igualdade, a liberdade e a
fraternidade, ameaçam a nossa vida em comum.
A criação de novas
instâncias supranacionais não tem que ser paga ao preço de impossibilitar o
exercício de cidadania. Os nossos povos não são menores de idade, nem colónias
de nenhum fundo de investimento, não conquistaram e defenderam a sua liberdade
para entregá-la a uma oligarquia financeira. Não são termos abstractos, senhores
deputados, todos os senhores conhecem bem o problema. É escandalosa a
facilidade com que se movem, aqui, os lóbis, ao serviço de grandes corporações,
assim como as portas giratórias, que convertem os representantes dos cidadãos
em milionários a soldo das grandes empresas. Há que dizê-lo alto e bom som:
esta maneira de funcionar rouba a soberania dos povos, atenta contra a democracia
e converte os representantes políticos numa casta.
Senhores deputados, a
democracia, na Europa, foi vítima de uma deriva autoritária. Na periferia
europeia, a situação é trágica: os nossos países converteram-se quase em
protectorados, em novas colónias, onde poderes que ninguém elegeu estão a
destruir os direitos sociais e a ameaçar a coesão social e política das nossas
sociedades.
Da América Latina aprendemos
que a dívida externa está desenhada para ser impagável e que os países que mais
têm crescido fizeram-no com um desagravamento substancial e uma auditoria
pública à sua dívida. Todos, nesta câmara, sabem da dívida perdoada, não há
muito tempo, à Alemanha. Não é apenas uma questão de justiça. Tem que ver com a
integração europeia e com a democracia: a dívida é, hoje, um mecanismo de mando
e saque dos povos do sul. É isso que está a suceder nos países que, com marcado
racismo, alguns denominam PIGS. Mas, suponho que os senhores são conscientes de
que não há Europa sem os seus povos do Sul, como não há sem os seus povos do
Leste, submetidos também a duras condições da Troika, cujo rumo ameaça destruir
o projecto europeu, deixando um rasto de miséria, pobreza e violência.
Porém, há outro caminho. Há
alternativa às políticas de empobrecimento e ao sequestro da soberania. Este
Parlamento Europeu, nesta hora crítica para a Europa, deve estar à altura, deve
mostrar sensibilidade e converter-se no epicentro de um estremeção democrático
na União Europeia, um estremeção que trave a deriva autoritária da Troika. Este
Parlamento deve expressar a legitimidade democrática de origem, que a todos nos
une – a voz dos cidadãos – e não os conluios entre elites. O Parlamento Europeu
não pode ser um prémio de consolação, nem uma reforma doirada.
Senhores deputados, hoje não
me dirijo a uma câmara de cinco, seis ou sete grupos parlamentrares. Tão-pouco
me dirijo aos aparelhos partidários. Dirijo-me aos senhores, senhoras e senhores
deputados, porque os senhores têm um contrato de responsabilidade política,
assinado com os vossos povos. Dirijo-me aos democratas e às suas consciências.
A nossa primeira fidelidade, a que todas as demais devem subordinar-se, é com
os cidadãos que nos elegeram. Eles não estão nos corredores deste edifício, nem
nos hotéis que rodeiam esta câmara. Mas, não se esqueçam; eles são os soberanos
e, cedo ou tarde, pedirão contas do que foi feito em seu nome.
Dirijo-me, também e muito
especialmente, aos meus colegas eurodeputados dos países do Sul da Europa. Os senhores
viram as consequências reais que têm as políticas impostas pela Troika. Os senhores
sabem que as políiticas de austeridade fracassaram: os nossos países são hoje
mais pobres, com economias destruídas, com sociedades feridas de injustiça e
instituições despedaçadas pela corrupção e pelo descrédito. Os senhores sabem
que está na hora de ajudar os nossos países a porem-se, de novo, em pé.
Peço-vos que, pelo menos, votem como gregos, como irlandeses, como portugueses,
como italianos, como checos, como polacos, como romenos, como espanhóis. Não só
para que possam olhar de frente a vossa gente, quando voltam a casa, mas
porque, assim, estarão a defender a Europa. Peço o voto consciente de muitos
dos senhores, que não se reconhecem neste sequestro da democracia, sabendo que
muitos estão sinceramente comprometidos com o bem-estar dos seus povos.
Peço-lhes o voto para travar a grande coligação que impõe austeridade e
totalitarismo financeiro.
Quero dirigir as minhas
últimas palavras aos cidadãos e povos da Europa, que saíram à rua, estes anos,
para defender a justiça social e a democracia. Aos milhões que haveis dito
basta, nas praças europeias, quero dizer-vos que sois o orgulho, o coração
democrático da Europa. Mantende alta a bandeira da dignidade. Nós, povos da
Europa, já passámos por piores situações e livrámo-nos dos déspotas. Não sei se
hoje poderemos arrebatar a presidência deste parlamento à grande coligação, mas
se nos seguis, empurrando, asseguro-vos que venceremos. O amanhã é nosso.
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