O QUE ELES ESCONDEM

quarta-feira, 19 de março de 2014


A ESTRATÉGIA DOS ESTADOS UNIDOS CONTRA A VENEZUELA

Por Alfredo Serrano Mancilla*

Democracia que não vota no candidato da embaixada, para os Estados Unidos, é democracia a banir. O Norte nunca aceitou que Chávez fosse o escolhido pelos povos do Sul, nem admite tão-pouco que o chavismo sem Chávez continue, ainda, a ser a opção mais votada. O guião de golpe em câmara lenta, inspirado em Gene Sharp, mas com muita violência, está a ser eficaz, mas incapaz ainda de destituir a Revolução Democrática Bolivariana. Chávez alterou tanto as regras do campo de batalha – ideológica, política, institucional e internacional – que a guerra planificada e internacional encontra-se, agora, fora de jogo. Apesar das mortes e da violência nas ruas da Venezuela e do desgaste da imagem internacional de Maduro, a tentativa duradoura de golpe não alcança ainda o seu objectivo final. A violência concentrada unicamente nas zonas ricas da parte leste de Caracas não é suficiente para apresentar-se como força política alternativa, com amplo apoio popular. Este facto, sem dúvida, está a dividir, actualmente, a oposição. Capriles continua a afirmar que sem uma maioria não se pode ser presidente, enquanto Leopoldo López prefere travestir uma minoria em maioria. O primeiro aceita que, na Venezuela, haja uma nova identidade política, o chavismo; o segundo, ainda se empenha em eliminá-la. Mas, por detrás dessas divergências há uma coisa que os une a ambos: não conseguem identificar a maneira de disputar, ao chavismo, o sujeito Povo.
Experimentaram com golpe de estado e greve no sector petrolífero, no ano de 2002; ensaiaram múltiplas estratégias eleitorais, com variedade de candidatos; depois da morte de Chávez, apostaram, novamente, na via eleitoral, em Abril de 2013, mas também não pôde ser. Com uma intensa guerra económica para ganhar um falso plebiscito, nas autárquicas de Dezembro de 2013, perderam uma vez mais – e não por pouco, mas com 11 pontos de diferença. Esperar até 2016 por novas eleições, tal como determina a Constituição Bolivariana, é algo tão democrático que não encaixa nos seus planos anti-democráticos. Aos Estados Unidos acabou-se-lhes a paciência. O seu falso bipartidismo tem uma posição clara contra o povo venezuelano, depois das suas ineficazes tentativas de ingerência, através dos organismos internacionais. Nem as Nações Unidas, nem a OEA, lhes deu razão. Além disso, a mudança de época, pós-Chávez, dá prioridade ao Sul, como espaço político, para resolver os problemas do Sul. ALBA (1) e CELAC (2) apoiam, sem fissuras, o governo da Venezuela; UNASUR (3) rejeita a violência, secunda os esforços do Governo da Venezuela e, além disso, aposta numa “comissão integrada por Ministros dos Negócios Estrangeiros dos países da UNASUR, para que acompanhe, apoie e assessore um diálogo político amplo e construtivo, orientado para a recuperação da convivência pacífica na Venezuela, confirmando a Conferência Nacional de Paz (4) criada”. Esta vitória, no terreno internacional é fruto de Chávez, mas também da experiência de Maduro como ex-vice-presidente e do bom trabalho de Jaua (5), nas suas últimas deslocações ao estrangeiro.

O libreto clássico dos Estados Unidos torna-se exíguo perante este cenário desfavorável. Por isso, voltam àquilo que nunca deixaram de fazer: as ameaças. Há meses, Fitch e Moody’s falaram de colapso económico; o The Economist pressagiou o “fim da festa”; o Bank of America e merrill Lynch alarmaram com a “primavera venezuelana”. Há dias, foi o vice-Presidente Biden quem se somava a deitar lenha no fogo. Dpois, o Secretário de Estado Kerry amedrontou com sanções económicas, via OEA, embora Insulza, o seu Secretário-Geral, lhe tenha dito que não pode socorrer-se desta opção porque “o caso venezuelano não põe em risco a democracia nem a segurança do continente americano”. O último, por agora, é Kelly, o Chefe do Comando Sul do Exército dos Estados Unidos, quem, perante a comissão de Defesa do Senado, afirma que que a Venezuela “vai precipitar-se numa catástrofe económica” e, mais, fala do perigoso rumor sobre “a divisão no seio das Forças Armadas venezuelanas”.
A transição geoeconómica para um mundo multipolar irrita muito a maior potência militar do mundo. No ano de 2014, os Estados Unidos pretendem recuperar, doa a quem doer, a sua hegemonia unipolar. A beligerãncia contra os países emergentes, mediante expectativas falsas de estagnação e a guerra na Ucrânia são provas disso. A Venezuela é um outro objectivo mais para a diplomacia dos Estados Unidos, na sua estratégia de domínio global que, agora, exige uma guerra civil para derrotar o chavismo, à força. E por que não, depois, voltar a controlar o petróleo e, consequentemente, o continente latino-americano.


O original encontra-se em www.publico.es , 17-3-2014
* Director do Centro Estratégico Latino-americano Geopolítico. Professor de Economia na Universidade Pablo Olavide, de Sevilha.

Notas do tradutor:
(1) ALBA – Aliança Bolivariana para os Povos da Nossa América. Tratado intergovernamental para a integração social, política e económica de vários países da América latina e Caraíbas. Substituiu o ALCA, dominado pelos EUA.

(2) CELAC – Comunidade de Estados Latino-americanos e das Caraíbas. Organismo para a integração e desenvolvimento.

(3) UNASUR – União das Nações da América do Sul. Organização para a integração sul-americana, nos sectores da energia, educação, ambiente, infra-estruturas, segurança e democracia.

(4) Conferência, convocada por Nicolás Maduro, de todos os sectores políticos e sociais, para discutir a situação do país.

(5) Elías Jaua Milano – Ministro dos Negócios Estrangeiros da Venezuela. 

 

 

 

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