A ESTRATÉGIA DOS ESTADOS UNIDOS CONTRA A
VENEZUELA
Por Alfredo Serrano Mancilla*
Democracia que não vota no
candidato da embaixada, para os Estados Unidos, é democracia a banir. O Norte
nunca aceitou que Chávez fosse o escolhido pelos povos do Sul, nem admite
tão-pouco que o chavismo sem Chávez continue, ainda, a ser a opção mais votada.
O guião de golpe em câmara lenta, inspirado em Gene Sharp, mas com muita
violência, está a ser eficaz, mas incapaz ainda de destituir a Revolução
Democrática Bolivariana. Chávez alterou tanto as regras do campo de batalha –
ideológica, política, institucional e internacional – que a guerra planificada
e internacional encontra-se, agora, fora de jogo. Apesar das mortes e da
violência nas ruas da Venezuela e do desgaste da imagem internacional de
Maduro, a tentativa duradoura de golpe não alcança ainda o seu objectivo final.
A violência concentrada unicamente nas zonas ricas da parte leste de Caracas
não é suficiente para apresentar-se como força política alternativa, com amplo
apoio popular. Este facto, sem dúvida, está a dividir, actualmente, a oposição.
Capriles continua a afirmar que sem uma maioria não se pode ser presidente,
enquanto Leopoldo López prefere travestir uma minoria em maioria. O primeiro
aceita que, na Venezuela, haja uma nova identidade política, o chavismo; o
segundo, ainda se empenha em eliminá-la. Mas, por detrás dessas divergências há
uma coisa que os une a ambos: não conseguem identificar a maneira de disputar,
ao chavismo, o sujeito Povo.
Experimentaram com golpe de
estado e greve no sector petrolífero, no ano de 2002; ensaiaram múltiplas
estratégias eleitorais, com variedade de candidatos; depois da morte de Chávez,
apostaram, novamente, na via eleitoral, em Abril de 2013, mas também não pôde
ser. Com uma intensa guerra económica para ganhar um falso plebiscito, nas
autárquicas de Dezembro de 2013, perderam uma vez mais – e não por pouco, mas
com 11 pontos de diferença. Esperar até 2016 por novas eleições, tal como
determina a Constituição Bolivariana, é algo tão democrático que não encaixa
nos seus planos anti-democráticos. Aos Estados Unidos acabou-se-lhes a
paciência. O seu falso bipartidismo tem uma posição clara contra o povo
venezuelano, depois das suas ineficazes tentativas de ingerência, através dos
organismos internacionais. Nem as Nações Unidas, nem a OEA, lhes deu razão.
Além disso, a mudança de época, pós-Chávez, dá prioridade ao Sul, como espaço
político, para resolver os problemas do Sul. ALBA (1) e CELAC (2) apoiam, sem
fissuras, o governo da Venezuela; UNASUR (3) rejeita a violência, secunda os
esforços do Governo da Venezuela e, além disso, aposta numa “comissão integrada
por Ministros dos Negócios Estrangeiros dos países da UNASUR, para que
acompanhe, apoie e assessore um diálogo político amplo e construtivo, orientado
para a recuperação da convivência pacífica na Venezuela, confirmando a
Conferência Nacional de Paz (4) criada”. Esta vitória, no terreno internacional
é fruto de Chávez, mas também da experiência de Maduro como ex-vice-presidente
e do bom trabalho de Jaua (5), nas suas últimas deslocações ao estrangeiro.
O libreto clássico dos
Estados Unidos torna-se exíguo perante este cenário desfavorável. Por isso,
voltam àquilo que nunca deixaram de fazer: as ameaças. Há meses, Fitch e Moody’s
falaram de colapso económico; o The Economist pressagiou o “fim da festa”; o
Bank of America e merrill Lynch alarmaram com a “primavera venezuelana”. Há
dias, foi o vice-Presidente Biden quem se somava a deitar lenha no fogo. Dpois,
o Secretário de Estado Kerry amedrontou com sanções económicas, via OEA, embora
Insulza, o seu Secretário-Geral, lhe tenha dito que não pode socorrer-se desta
opção porque “o caso venezuelano não põe em risco a democracia nem a segurança
do continente americano”. O último, por agora, é Kelly, o Chefe do Comando Sul
do Exército dos Estados Unidos, quem, perante a comissão de Defesa do Senado,
afirma que que a Venezuela “vai precipitar-se numa catástrofe económica” e,
mais, fala do perigoso rumor sobre “a divisão no seio das Forças Armadas
venezuelanas”.
A transição geoeconómica
para um mundo multipolar irrita muito a maior potência militar do mundo. No ano
de 2014, os Estados Unidos pretendem recuperar, doa a quem doer, a sua
hegemonia unipolar. A beligerãncia contra os países emergentes, mediante
expectativas falsas de estagnação e a guerra na Ucrânia são provas disso. A
Venezuela é um outro objectivo mais para a diplomacia dos Estados Unidos, na
sua estratégia de domínio global que, agora, exige uma guerra civil para derrotar
o chavismo, à força. E por que não, depois, voltar a controlar o petróleo e,
consequentemente, o continente latino-americano.* Director do Centro Estratégico Latino-americano Geopolítico. Professor de Economia na Universidade Pablo Olavide, de Sevilha.
Notas
do tradutor:
(1) ALBA – Aliança
Bolivariana para os Povos da Nossa América. Tratado intergovernamental para a
integração social, política e económica de vários países da América latina e
Caraíbas. Substituiu o ALCA, dominado pelos EUA.
(2) CELAC – Comunidade de
Estados Latino-americanos e das Caraíbas. Organismo para a integração e
desenvolvimento.
(3) UNASUR – União das
Nações da América do Sul. Organização para a integração sul-americana, nos
sectores da energia, educação, ambiente, infra-estruturas, segurança e
democracia.
(4) Conferência, convocada
por Nicolás Maduro, de todos os sectores políticos e sociais, para discutir a
situação do país.
(5) Elías Jaua Milano –
Ministro dos Negócios Estrangeiros da Venezuela.
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