O QUE ELES ESCONDEM

quarta-feira, 18 de junho de 2014


É PREOCUPANTE A BAIXA INFLAÇÃO NA EUROZONA

Por Eduardo Garzón Espinoza*

 Chama-se “inflação” ao aumento generalizado dos preços dos produtos, enquanto o termo “deflação” alude a uma descida generalizada dos mesmos. Em condições normais de crescimento, numa economia capitalista, os preços costumam subir, pelo que a inflação é um fenómeno corrente e, inclusive, necessário para o bom funcionamento do ciclo económico. Mas, claro, sempre que o ritmo de crescimento dos preços não seja muito elevado, porque, caso contrário, o seu impacto sobre a evolução económica seria muito prejudicial: quando os preços aumentam muito rapidamente, as decisões dos agentes económicos aceleram, porque preferem comprar e investir o mais depressa possível, para evitar fazê-lo a preços superiores. O aumento e concentração de compras em pouco tempo determina que os vendedores aumentam ainda mais os preços dos seus produtos para saírem beneficiados da conjuntura, provocando, em última instãncia, um círculo vicioso, que empurra os preços para cima, a um ritmo cada vez mais rápido. Num contexto com estas características, a incerteza é total e os agentes económicos não se atrevem a realizar investimentos ou planos de futuro, vendo-se o ciclo económico fortemente desestabilizado.
Tão-pouco é desejável que o ritmo de crescimento dos preços seja muito baixo, porque costuma ser sinal de que a economia não está saudável, tal como acontece na actualidade. Além disso, se assim for, corre-se o risco de se sofrer uma deflação, o que é muito prejudicial para a economia, porque, se os agentes económicos julgam que os preços vão baixar, retardarão as suas compras e investimentos, de forma que a actividade económica se ressentirá, provocando, por sua vez, mais baixas nos preços e, de novo, um ciclo vicioso do qual é muito difícil sair.

Considera-se, por isso, que uma inflação moderada (entre 2% e 6%, aproximadamente) é o ideal para um correcto funcionamento da economia, pois os agentes económicos nem atrasarão, nem adiantarão pôr em andamento as suas decisões.

O aumento de preços está a ser, ultimamente, muito lento nos países que partilham a moeda única e os dirigentes europeus mostraram já preocupação pelo risco de se entrar numa deflação. Com efeito, segundo o Fundo Monetário Internacional, o país que corre mais risco de sofrer deflação é a Espanha. Daí que seja intensa a pressão que se exerce sobre o Banco Central Europeu, para que evite um cenário com essas características. Estas solicitações parecem ter sido escutadas pela entidade europeia, porque o seu presidente, Mario Draghi, anunciou que, neste mês de Junho, poderia actuar em consequência.
O que os bancos centrais costumam fazer para tentar aumentar os preços é criar mais dinheiro e emprestá-lo aos bancos privados, para que estes o ponham em circulação, mediante empréstimos às famílias e empresas. Não obstante, isto é algo que, há já algum tempo, fazem bancos centrais como o do Japão ou o dos Estados Unidos e não conseguiram evitar o risco de deflação. Porquê? Porque, enquanto os bancos tiverem sérios problemas nos seus balanços e enquanto a actividade económica não recuperar, os bancos não vão estar nunca interessados em emprestar dinheiro. Consequentemente, esta política monetária convencional resultará totalmente ineficaz para aumentar os preços de bens e serviços.

Contudo, resulta, sim, eficaz para aumentar os preços dos activos financeiros, já que o que fazem os bancos com o dinheiro, que lhes chega dos bancos centrais, é investi-lo em activos financeiros que oferecem determinadas rentabilidades (como os títulos de dívida pública ou as acções das empresas). Como consequência, o preço destes activos aumenta, provocando pequenas bolhas financeiras, que aumentarão de tamanho, se a tendência prosseguir. Isto é precisamente o que está a passar-se nos Estados Unidos, depois de vários injecções de dinheiro por parte do seu banco central e que levou a bolsa de Wall Street a níveis historicamente altos. Numerosos economistas estado-unidenses denunciam que estas bolhas financeiras não só beneficiam unicamente uma pequena parte da população (a mais endinheirada), mas que, também, abrem a porta a futuras crises financeiras. Além disso, não traduzem, de modo nenhum, uma recuperação económica sólida e estável.
Se, este mês, o Banco Central Europeu aplicar medidas semelhantes, como anunciou, encontrar-nos-emos com uma actividade económica que não recuperará, com preços de bens e serviços que, tão-pouco aumentarão e, além disso, poderia desencadear-se bolhas financeiras, que desestabilizariam, ainda mais, a zona euro.

A solução não pode passar por se levar a cabo estas políticas monetárias convencionais. O que os dirigentes europeus não querem entender é que uma inflação baixa é consequência da conjunção de um sobreendividamento dos agentes económicos e a aplicação de medidas de austeridade (redução de salários, corte na despesa pública, etc.). Enquanto as empresas e famílias continuarem altamente endividadas (e, por isso, canalizando o pouco dinheiro que recebem para amortizar da dívida) e enquanto as políticas de austeridade impedirem as famílias de consumir e as empresas de investir, a recessão económica continuará. Mas, claro, os credores das dívidas (fundamentalmente, bancos e entidades financeiras, tanto espanholas como de outros países europeus) verão, pouco a pouco, os bolsos encherem-se-lhes, que é, no fim de contas, do que se trata.
A única solução possível para esta recessão económica (que tenha em conta o bem-estar material e social da maioria da população) tem que passar, necessariamente, por uma reestruturação das dívidas (tanto públicas como privadas – das empresas e das famílias) e por importantes estímulos fiscais, que aumentem o rendimento das famílias e empresas. Deste modo, o Banco Central Europeu deveria utilizar a política monetária, não para continuar a dar, aos bancos, a oportunidade de prosseguir o negócio, mas para dar aos Estados europeus o apoio monetário necessário, de forma a que possam incrementar a despesa pública, com uma margem ampla.

1 de Junho de 2014
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O original encontra-se em Andaluces.es 
 * Licenciado em Economia e em Administração e Direcção de Empresas. Membro do Conselho Científico de ATTAC – Espanha.

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