O QUE ELES ESCONDEM

sexta-feira, 6 de junho de 2014


 

Venezuela: um osso duro de roer

Por Pedro Campos

«Entre as acções previstas em Junho em função do golpe contínuo, está a participação de mercenários provenientes de Guatemala, El Salvador e México (...), os quais estão a ingressar no país para realizar acções de sabotagem com ligação com bandos organizados, para o qual se estabeleceu um pagamento semanal...». Estas declarações de José Vicente Rangel, jornalista e comentador político de prestígio, que durante os anos da IV República teve um papel determinante na divulgação dos crimes políticos que caracterizaram esse período político venezuelano onde nasceu a figura do «desaparecido político», que depois ganhou uma dimensão terrível na América Latina com o desenvolvimento do Plano Condor, surgem no seguimento da divulgação de novos planos de golpe de Estado e de assassinato de Maduro e outras figuras bolivarianas.
Cinco figuras graúdas aparecem no desenho deste «pentágono criolo». À frente delas está Corina Machado, oriunda de uma das famílias «donas do Vale», com acções em companhias de electricidade, bancos e fundições. A tudo o anterior, junta-se o facto de ter assinado o decreto de Carmona Estanga, o mesmo que se auto-juramentou como presidente da república na sequência do golpe de Estado de Abril 2002. A banca está representada por Eligio Cedeño, hoje fugido e refugiado nos Estados Unidos e que leva anos financiando a contra-revolução. Também carrega às costas uma imensa fraude imobiliária. Pela indústria petrolífera responde Pedro Burelli, alto funcionário de PDVSA nos anos 90. É dos que acham que o petróleo não deve ser negócio do Estado e apoia a venda da empresa. Vive também nos Estados Unidos e está casado com uma Vollmer, outra família de «donos do Vale». Os restantes dois são figuras dos «velhos» partidos da IV República. Gustavo Tarre, deputado da democracia-cristã em vários parlamentos, e Diego Arria, uma múmia da social-democracia, que foi governador de Caracas nos 70. Nas eleições de 1978 «bateu-se» com Herrera Campins numa eleição presidencial, mas ficou-se pelos... noventa mil votos. Nisso, vai de mãos dadas com Corina Machado, que nas internas da oposição conseguir obter ainda menos votos! Se quisermos fazer do «pentágono» um «hexágono» é só acrescentar o nome de Salas Romer, empresário metido a político e homem que anima economicamente o movimento Juventude Activa Venezuela Unida, uma cópia da famosa Otpor, que fez estragos na Jugoslávia e ajudou a desmembrar esse país.

A denúncia do golpe e da conspiração para o magnicídio está documentada com correios electrónicos e mensagens telefónicas entre estes contra-revolucionários, mas sabe-se que não estão só. Há outros nomes em reserva.
Como é óbvio, por detrás deste «pentágono criolo» está o outro Pentágono, o que realmente manda.

Sabotagem económica à chilena
Entretanto, seguindo o modelo utilizado pela CIA no Chile de Allende, a sabotagem económica não amaina. Passo a passo, Washington vai aplicando a receita que funcionou para levar Pinochet ao poder.

Richard Helms, chefe da CIA, num telegrama a Kisssiger, escrevia então: «...o pretexto mais lógico para pôr em marcha os militares seria uma repentina situação económica desastrosa». O embaixador de Washington recomendou «uma série de iniciativas económicas hostis para contribuir para uma rápida desaceleração da economia e provocar uma reacção militar». Era a política de fazer «gemer a economia do Chile» com a difusão de rumores, falsos ou reais, sobre desabastecimentos, financiamento de greves, divisão dos sindicatos e uma política comunicacional de desinformação onde o jornal Mercúrio teve um papel predominante . Nenhum destes ingredientes – e outros – está ausente do que se passa hoje em Caracas na tentativa de quebrar a coluna vertebral de uma nova realidade política que luta por se afirmar na América Latina. Mas a Caracas de 2014 não se parece muito à Santiago de 1973. O imperialismo, esse sim, é o mesmo só que com muitos mais problemas, ou seja muito mais perigoso. Um golpe de Estado tradicional não parece nada factível com umas forças armadas impregnadas de sentimentos bolivarianos. Uma guerra económica numa Venezuela que controla, através da indústria petrolífera, o seu ingresso de divisas, é osso duro de roer. A guerra mediática é outra coisa. Dentro do país, os grandes media bailam ao ritmo de Washington e a nível internacional têm mesmo a faca e o queijo na mão. Não passarão, mas conseguem fazem muito dano.

In Avante!, 5 Junho 2014

 

 

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